SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE - PARA ONDE TE QUEREM LEVAR?

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A propósito dos 40 anos do Serviço Nacional de Saúde (SNS) é oportuno recordar o artigo 64º da Constituição da República Portuguesa: “O direito à saúde é realizado através de um Serviço Nacional de Saúde universal e geral e tendencialmente gratuito”. Para concretizar esta norma constitucional foi promulgada em Setembro de 1979 a lei que institucionalizou o SNS.

Através da prestação de cuidados de saúde articulados entre os Centros de Saúde (medicina preventiva nas suas várias vertentes, diagnóstico precoce das doenças crónicas e seu acompanhamento) e os Hospitais (tratamento de situações urgentes e de doenças que necessitam uma abordagem especializada), foi possível melhorar o nível de saúde dos portugueses, avaliado por vários indicadores.

A mortalidade infantil desceu de 83 mortes por cada 100 mil nados vivos nos anos 70, para 3,3 em 2006 e 2,9 em 2017. A esperança média de vida aumentou de 67,1 anos em 1970 para 81,3 anos em 2017, sendo este valor mais elevado do que a média da União Europeia (UE). Isto só foi possível com o SNS, com a sua organização e com o trabalho integrado e dedicado de muitos profissionais de saúde, médicos, enfermeiros, técnicos de saúde, assistentes operacionais.

Desde que foi criado, o SNS tem sido alvo de ataques com o objectivo de o descaracterizar e, no limite, destruí-lo, entregando a prestação de cuidados de saúde a grupos privados. Vários argumentos têm sido usados para tentar provar de que não é viável. Porém, comparando a despesa per capita portuguesa (1989 euros em 2017) com a média da UE, aquela é 30% inferior e tem-se vindo a afastar desta. Considerando os excelentes indicadores de saúde alcançados, é caso para dizer que fazemos o mesmo (ou mais) com menos.

Argumenta-se também que o SNS gera desperdícios e que por isso dá prejuízo, pondo-se debaixo do tapete a sub-orçamentação crónica a que tem sido sujeito. Vários responsáveis têm afirmado que é necessário utilizar melhor os recursos disponíveis.

De acordo; mas é isso o que se passa na realidade? Não infelizmente! A Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo gastou durante anos, em reparações de equipamentos antiquados de imagiologia, recursos que dariam para os substituir várias vezes e gasta anualmente em Ressonâncias o equivalente à instalação desta técnica no Serviço de Imagiologia.

Na Comissão Parlamentar de Saúde em 3 de Julho último, o Presidente do Conselho Regional do Sul da Ordem dos Médicos declarou que a Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano “deslocou mais de 5 milhões de euros para pagar a tarefeiros médicos, quando os encargos com cada médico diferenciado do quadro são 56 mil euros por ano; aquela valor daria para pagar a 100 médicos”.

Pergunta-se: boa gestão dos recursos disponíveis? Por outro lado,tem havido um aumento da transferência de custos a cargo dos próprios utentes (taxas moderadoras, medicamentos, exames complementares, consultas privadas, tratamentos dentários, seguros de saúde, entre outras despesas). Em 2017, estes encargos representavam 28% da despesa total da saúde, muito acima da média da UE (10%) e têm aumentado todos os anos.

É caso para perguntar: SNS tendencialmente gratuito ou cada vez mais tendencialmento pago? Como é do conhecimento geral, o SNS não está bem. Os grandes responsáveis pelo actual estado do SNS têm sido os sucessivos governos do PS, PSD e CDS, através das suas políticas de direita.

Reconhecem agora, hipocritamente, que é necessário dotar o SNS com os meios orçamentais adequados para reverter a situação, esquecendo-se de esclarecer que foram e são eles os principais actores dessas mesmas políticas.

Vale a pena registar as suas promessas: “a valorização do SNS é uma prioridade dos eleitos do PS” (Pedro do Carmo); “reforço dos serviços públicos de proximidade com relevância para o SNS” (Telma Guerreiro); “exigir mais investimento público”, nomeadamente “na saúde, reclamando a construção da 2ª fase do Hospital e a dotação de profissionais necessários” (João Dias); “reforço do princípio da responsabilidade do Estado no garante e na promoção da Saúde,através do SNS; reduzir os custos que os cidadãos suportam na saúde; investimentos na melhoria do SNS” (Programa do Governo).

Convem alertar que não basta reforçar o orçamento para o SNS; é preciso assumir que esse reforço seja aplicado no aumento das retribuições dos profissionais e na progressão nas suas carreiras e sua valorização, na melhoria das condições de trabalho, na renovação dos equipamentos e na utilização da capacidade instalada, e não na transferência desse reforço para as entidades privadas de saúde.

Caro Leitor, se teve a paciência e a condescendência de me ter lido até aqui, chegou o momento de lhe fazer uma pergunta e de lhe dirigir um apelo. A pergunta é simples: de que lado está? A favor ou contra um SNS universal, geral e gratuito, de gestão pública? O apelo é mais complexo e multifacetado: indigne-se, manifeste-se, barafuste, revolte-se, critique, questione, informe-se, tenha opinião própria, tome partido, assine petições e abaixo assinados, adira a movimentos (porque não aderir ao Movimento de Utentes de Beja?), escrutine se as promessas feitas solenemente são ou não seguidas e por quem.

O SNS necessita de si, de nós todos, para impedirmos que não caminhe para onde o querem levar, para uma morte certa, mas sim que inverta a direcção e o levemos para um caminho diferente, um caminho de renovação, de qualidade, de acessibilidade fácil, de satisfação para os utentes e para os seus profissionais.